segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Não temos justificação para acreditar que o Sol irá nascer amanhã

«É importante que estejamos cientes da natureza radical da tese de Hume. Ele argumenta que todo o raciocínio indutivo é inválido: não temos razões a priori ou empíricas para aceitar crenças baseadas em inferências indutivas. Não temos justificação para acreditar que o sol irá nascer amanhã. O ponto crucial é este: se eu afirmar que o sol vai nascer amanhã e o meu amigo afirmar que ele se vai transformar num ovo estrelado gigante, a minha crença não é, de acordo com Hume, mais justificada do que a do meu amigo. Claro que eu não tenho amigo algum que acredite nisto, e Hume tem uma explicação para esse facto. Devido ao “costume” ou ao “hábito”, todos pensamos em termos indutivos. Contudo, este tipo de pensamento não é justificado; resulta apenas de certas disposições psicológicas que criaturas como nós possuem: não é, portanto, a razão que é o guia da vida, mas sim o costume. […] Os animais também têm essas disposições; são guiados pelo costume e esperam que as regularidades que experienciaram continuem. Contudo, como observa Russell, a galinha a que o agricultor dá de comer todos os dias pode ser degolada amanhã. A nossa posição é análoga à da galinha: esperamos que o Sol nasça todas as manhãs tal como a galinha espera o seu alimento, mas nenhum de nós tem qualquer justificação para as nossas crenças ou comportamento. Uma resposta comum a esta posição cética é que sabemos que o Sol irá nascer amanhã porque temos uma explicação científica para que tal aconteça, descrevendo o movimento da Terra em relação ao Sol. Aqui, no entanto, podemos ver todo o alcance do argumento de Hume. Chegámos à nossa narrativa através de sucessivas observações astronómicas. A nossa explicação científica do nascer do Sol é, portanto, indutiva, pelo que está igualmente sujeita ao argumento de Hume. De acordo com Hume, o cientista não pode justificar a sua crença de que a gravidade continuará a manter os corpos celestes nas órbitas que até agora temos observado seguirem.»

 Dan O’Brien, Introdução à Teoria do Conhecimento

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