sábado, 3 de novembro de 2012

O argumento do benefício

A sugestão dos pais baseava-se na ideia de que, uma vez que Teresa ia morrer em breve, os seus órgãos de nada lhe serviam. As outras crianças, no entanto, poderiam beneficiar deles. Assim, o raciocínio parece ter sido o seguinte: Se podemos beneficiar alguém sem fazer mal a outra pessoa, devemos fazê-lo. Transplantar os órgãos beneficia as outras crianças sem prejudicar a bebé Teresa. Logo, devemos transplantar os órgãos.
Será isto correto? Nem todos os argumentos são sólidos; por isso, não queremos apenas saber que argumentos podem ser aduzidos em defesa de uma dada posição, mas também se esses argumentos são bons. Em geral, um argumento é sólido se as suas premissas e a conclusão resulta logicamente delas. Neste caso, poderemos interrogar-nos sobre a proposição segundo a qual Teresa não seria prejudicada. Afinal de contas, ela morreria; isso não é mau para ela? Mas se refletirmos, parece claro que nestas circunstâncias trágicas os pais tinham razão – estar viva não lhe servia de nada. Estar vivo só é um benefício quando permite a alguém realizar atividades e ter pensamentos, sentimentos, e relações com outras pessoas – por outras palavras, se permite a alguém ter uma vida. Na ausência destas condições, a mera existência biológica não tem valor algum. Por isso, mesmo que Teresa pudesse continuar viva por mais alguns dias, isso nada lhe traria de bom. (Podemos imaginar circunstâncias nas quais outras pessoas beneficiariam em mantê-la viva, mas não é o mesmo que ser ela a beneficiar disso.)
O argumento do benefício fornece, pois, uma poderosa razão para o transplante dos órgãos. Quais são os argumentos do lado contrário?

James Rachels, Elementos de Filosofia Moral, Tradução F.J. Azevedo Gonçalves, Gradiva, Lisboa, 2004, pp. 15-16

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